Ser felizes é o que todos nós
queremos. Doam quanto doerem os passos que damos, e ainda que pareça
interminável o caminho, aceitamos tudo se tivermos a convicção, ou pelo menos a
esperança, de que um dia – um belo dia, como se diz nos contos de fadas – se
abrirá diante de nossos olhos, esplêndida, a felicidade.
A felicidade tem mil e um jeitos de
ser. Há para cada um de nós uma felicidade. Para os pessimistas e os exigentes,
a felicidade é uma coisa tão grandiosa e maravilhosa que nunca está ao nosso
alcance, ou só se atingirá com muita dor e muito sacrifício.
Para outros, a felicidade é um
acontecimento diário, e existem dias especialmente venturosos, em que pode
haver até mais de uma.
Altair é dos que acham que a
felicidade é um bem tão valioso e importante que não pode jamais ser simples.
Felicidades corriqueiras, para ele, são teoricamente impossíveis. O nome exato
delas seria alegrias – um dos mais baixos estágios da felicidade.
Sua namorada, Debrinha, já é do tipo
que está sempre feliz, por qualquer motivo e até por motivo nenhum. Tudo, até
respirar, a faz rir.
Hoje ele e ela foram a um cinema, no
shopping, assistir a uma comédia. Debrinha riu o tempo todo, e com tanto gosto
que acabou contagiando os que estavam sentados perto. Menos Altair.
O filme acabou, e agora eles estão
numa sorveteria, ali mesmo no shopping. Ela, com o rosto brilhando de
satisfação, vai lembrando cenas do filme. Ele só ouve. A cada cena recordada
ela ri. Ele olha para ela e pergunta-se por que, sendo tão bonita, é também tão
bobinha.
“Sabe o que eu achei mais
engraçado?”, ela diz.
“O que foi?”, ele pergunta, sem
interesse.
“Aquela hora que o cara vai pagar a
conta e sai do bolso dele aquela lagartixa.”
“Era uma lagartixa aquilo?”
Ela não tem tempo de responder. Ao
lado da mesinha deles está sentado um casal. O homem diz:
“Lagartixa, só? Aquilo era uma
lagartixona”, e começa a gargalhar, acompanhado pela mulher.
Debrinha se põe a rir também. E o
riso dos três é tão escancarado que os outros fregueses desatam a gargalhar.
A garota da caixa pergunta à outra,
que leva os sorvetes às mesas:
“Eles estão rindo do quê?”
A outra olha para Altair, vê seu
rosto sério e não tem dúvida:
“Estão rindo daquele tonto ali.”
Raul
Drewnick
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